terça-feira, 2 de outubro de 2012

Caracterização dos modelos históricos e comparatísticos: Sistema Administrativo Francês e Sistema Administrativo Anglo-Saxónico

Numa perspectiva de evolução histórica podemos identificar 3 períodos do Contencioso Administrativo (e, passando agora a utilizar, as sugestivas expressões do Prof. Vasco Pereira da Silva):
  1. Fase do Pecado Original – Séculos XVIII e XIX que corresponde ao surgimento do Direito Administrativo, chamado também de “Sistema do Administardor-Juíz” devido à confusão entre a Administração e a Justiça (época do Estado liberal).
(É nesta altura que se criam, então, os sistemas de tipo britânico e francês que passamos a analisar. )
  1. Fase do Baptismo – Com a jurisdicionalização do contencioso, no Século XX, assiste-se a uma autonomia dos tribunais que não é, no entanto, integral visto que há uma limitação quanto ao âmbito e quanto aos poderes do Juíz.
  2. Fase do Crisma – Assiste-se nos anos 70 à constitucionalização alemã do Direito Administrativo com direitos fundamentais e de natureza subjectiva (particular goza de poderes face à Administração). Reafirma-se a natureza jurisdicional do contencioso (Juíz goza, agora, de plenitude de poderes face à Administração) mas introduzindo-se uma subjectivização (tutela dos direitos dos particulares).

O modelo Administrativo Francês surge no contexto da Revolução Francesa de 1789 que proclamou a ideia de separação de poderes (Montesquieu); surge a “Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão” (Déclaration des Droits de l'Homme et du Citoyen) que pretende um sistema de “garantia dos direitos” e criam-se tribunais administrativos.
A Administração de tipo francês goza de poder para executar a suas decisões por autoridade própria, sobrepondo-se aos interesses dos particulares (com a finalidade de prosseguir o interesse público ) e, por isso , vista como agressiva dos privados.
 Caracteriza-se também por ser um Estado concentrador de poderes – sistema administrativo centralizado – em que as autarquias locais, os municípios obedecem ao poder central administrativo que era o Ministério ( fazendo lembrar o Leviathan – Hobbes).
No entanto, gerou-se uma indiferenciação entre duas funções do Estado (executivo e judicial): considerando-se que “julgar a administração era ainda administrar” permitiu-se que a Administração Pública se julgasse a ela mesma e, invocando-se o princípio da separação de poderes, proibiu-se que os tribunais judiciais interferissem na esfera da Administração Pública. Gerou-se, assim, a promiscuidade entre a Administração e a Justiça (administrador-juíz).


Na lógica liberal inglesa também houve a fase do “pecado original” mas de uma maneira diferente: não existia a ideia de integração numa entidade superior, portanto, a Administração Pública e os Tribunais subordinaram-se ao “direito comum”.
Foi em 1688, aquando a Grande Revolução inglesa, que passou a haver um sistema de administração judiciária e que se caracterizou pela separação de poderes e pela já mencionada submissão do Rei e da Administração Pública ao direito comum.
Estamos perante um sistema descentralizado em que as autarquias locais tinham uma grande autonomia perante o poder central (ao contrário do modelo francês) e em que a administração pública não tem poder coactivo e, por isso mesmo, não pode executar as suas decisões.
Os particulares lesados podiam recorrer a um tribunal superior (King’s Bench ou Queen’s Bench que surgiu em 1215 no Reino Unido e é um dos tribunais mais antigos de Inglaterra.) .
A ideia de “Estado” era desconhecida do regime britânico (os órgãos controlavam-se reciprocamente) e não havia privilégios da Administração.
Surge, na evolução histórica inglesa, uma aproximação ao sistema francês mais tardio aquando uma lógica social que altera o entendimento existente até então.
Novas funções atribuídas aos poderes públicos dão origem à criação de “órgãos administrativos especiais” que não são verdadeiros tribunais e que concorrem com os tribunais judiciais, que gozam de poderes autoritários e tutelam os direitos dos particulares nas relações jurídico-administrativas .
Surge, desta forma, a fase do “pecado original” e a confusão entre a Administração e a Justiça no Reino Unido.

Bibliografia utilizada:
  • Aroso de Almeida, Mário – “Manual de Processo Administrativo”, Almedina, Coimbra 2010
  • Pereira da Silva, Vasco – “O Contencioso Administrativo no Divã da Psicanálise”, Almedina, 2ª Ed., Coimbra 2009
  • Apontamentos das aulas de Contencioso Administrativo
  • Wikipedia, enciclopédia livre (http://pt.wikipedia.org/)  

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