sábado, 8 de dezembro de 2012

Alegações Finais do Ministério da Defesa Nacional

Processo n.º 123921/12

Meritíssimos Juízes, Exmo. Sr. Procurador do MP,

Pensamos já termos demonstrado perante este augusto Tribunal a verdade material dos factos em causa. Estando confiantes que o Tribunal dará os mesmos como provados. Temos a certeza que se chegará a um juízo de direito favorável ao Ministério da Defesa, parte que defendemos.

Não obstante, não nos ilibamos de apresentar uma argumentação sucinta desses mesmos factos e das suas consequências de direito, que deixamos à consideração do Tribunal:

I – SOBRE A INADMISSIBILIDADE DO PEDIDO SOB FORMA DE ACÇÃO ADMINISTRATIVA ESPECIAL PARA IMPUGNAÇÃO DE ACTO ADMINISTRATIVO:

O acto de resolução em causa não se tem por destacável dos restantes procedimentos do Ministério, de acordo com o art. 51.º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), pela falta de eficácia externa do mesmo.
O acto levado a cabo pelo Ministério da Defesa corresponde ao exercício de poderes contratuais, não se demarcando das restantes práticas contratuais entre o Ministério e a Empresa “Estamos-nas-lonas, S.A.”.

Aliás, esta tem sido a jurisprudência maioritária do Supremo Tribunal Administrativo, relembrando a este Tribunal, a título meramente exemplificativo, a posição do STA no Ac. de 05-02-2002, onde se expressa “os actos do contraente público que consistam no exercício de direitos putativos emergentes do contrato administrativo constituem, em regra, actos administrativos para efeitos de recurso contencioso”. No mesmo Ac., mais à frente se adianta que “tal acto [no caso, um acto de resolução de um contrato público] não se pode qualificar como administrativo, antes se consubstanciando em mera declaração de base negocial, não envolvendo o uso de poderes de autoridade administrativa, actuando a Administração a este nível como parte”.

Mais entendemos que, nos termos do Código dos Contratos Públicos (CCP), nunca esta actuação seria destacável ou qualificável como acto administrativo. O direito de resolução entendido no CCP resulta precisamente da existência de um contrato, e só neste âmbito deve ser entendido. Uma actuação à margem deste Código desvirtuaria todo o diploma legal.

Na verdade, a argumentação de A é em todo redundante quanto a este ponto. Ao contrário do que o A afirma, não ficou nada claro perante este Tribunal qual a razão para a defesa da destacabilidade do acto de resolução. É que ao contrário do que A afirma, nem todo o acto de resolução consubstancia um acto de poder da Administração. Pelo contrário, este é precisamente um acto que, dada a natureza da relação, só pode ser visto como integrado numa prática contratual, em tudo tutelada pelo CCP.

Temos que não estamos perante um acto administrativo.


II – SOBRE A INADMISSIBILIDADE DO PEDIDO DE ANULABILIDADE DO ACTO DE RESOLUÇÃO,  DADA A ADMISSIBILIDADE DO PEDIDO:

Ora, argumenta o A que a actuação de R violou os princípios da justiça, da proporcionalidade e da boa fé, consagrados no art. 266.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa (CRP) e nos arts. 6.º e 6.º-A do Código do Procedimento Administrativo (CPA).

Como já ficou bem patente na contestação entregue, não houve, na actuação de R qualquer violação de nenhum destes princípios. Relembramos ao Tribunal a linha de argumentação desenvolvida na contestação, particularmente nos articulados 90.º- 94.º. A resolução não se baseou em qualquer acto de má fé de R e muito menos esta actuação se deve ter como infundada ou abrupta – lembramos ao Tribunal a apresentação das provas dos anexos IV, V, VI, VII, referentes ao novo prazo concedido a A para o cumprimento da prestação e da fundamentação da resolução. Notificações e cartas essas que, relembramos, nunca foram contestadas por A em Tribunal.

Não se tem obviamente, e conforme o exposto, como violado o art. 66.º al. c) do CPA, que exige a notificação aos interessados de actos administrativos que “criem, extingam, aumentem ou diminuam direitos ou interesses legalmente protegidos, ou afectem as condições do seu exercício”. Chamamos, mais uma vez, à colação os anexos IV, V, VI e VII como representativos da diligência do Ministério em todas as notificações exigidas pela lei para a validade deste acto. E, mesmo que A tenha como não recebidas as cartas enviadas por R, tal facto não pode ser nunca imputável ao Ministério, porquanto todas elas foram efectivamente recebidas, como ficou provado, por um funcionário da empresa. Tal é imputável, por culpa sua, a A.

O dever de fundamentação exigido pelo art. 124.º do CPA tem-se também como cumprido. Consciente das diligências necessárias à sua boa actuação, R fundamentou o respectivo acto de resolução do contrato cumprindo todos os requisitos do art. 125.º do CPA. Para tal, pedimos ao Tribunal uma apreciação atenta do Anexo VII.

Quanto à pretensa violação do art. 130.º do CPA, esta não deve ser de todo considerada. É que a publicidade dos actos administrativos só é obrigatória quando exigida por lei. Não são as circunstâncias ou o valor do contrato, conforme A invoca, que tornam ou não exigível a obrigatoriedade da publicidade dos actos administrativos – mas sim a lei. O acto de resolução levado a cabo pelo Ministério tem-se como completamente eficaz, por não ser este um acto em que a lei exige publicidade.

Por último, quanto à obrigatoriedade da audiência dos interessados exigida pelo art. 100.º do CPA antes de uma tomada de decisão da Administração, não se tem esta como violada. Na verdade, a ratio desta norma é, perante a iminência de um acto desfavorável à contraparte, poder-se ouvir uma vez mais os interessados, nomeadamente para os informar do sentido provável desta.
A empresa “Estamos-nas-lonas, S.A.” foi expressamente informada da pretensão do Ministério, através de carta registada com aviso de recepção, em resolver o contrato, conforme Anexo V. Nunca A, após conhecimento de tal pretensão, demonstrou interesse no cumprimento da prestação, ainda que atrasado. Pelo que a audiência dos interessados se tem como dispensada nos termos do art. 103.º n.º 2 al. a) do CPA.

E sempre se lembre, Meritíssimos Juízes, que o procedimento exigido pelo art. 100.º do CPA não se refere a casos como o presente. Esta é uma formalidade que apenas faz sentido se integrada num procedimento que resulte num acto administrativo. E, conforme argumentado por nós, e sustentado pela jurisprudência do STA, não estamos perante um acto administrativo, pelo que, nunca esta formalidade era exigível.

No caso de se considerar o acto de resolução como um acto administrativo, o acto de resolução do Ministro da Defesa não padece de nenhum vício que o torne inválido. O acto de resolução deve considerar-se plenamente válido e eficaz.


III – SOBRE A INADMISSIBILIDADE DOS PEDIDOS SUBSIDIÁRIOS:

Ficou provado perante este Tribunal que A nunca cumpriu atempadamente as suas obrigações.

Reiteramos o cumprimento defeituoso da primeira prestação por parte de A, conforme ficou provado por prova documental e testemunhal.

E que foi tal facto que legitimou a excepção de não cumprimento por parte de R, cumprindo todas as exigências do art. 325.º do CCP, que no seu n.º 4 remete para os instrumentos gerais de incumprimento. R foi diligente e notificou A com um novo prazo para o cumprimento pontual. A nunca atendeu a tal notificação, que foi efetivamente recebida por um funcionário da empresa, conforme provado neste Tribunal. R só não teve conhecimento da mesma por culpa sua.

A oitava prestação não foi cumprida por parte de A, entrando A em mora quanto a esta prestação a 1 de Agosto. Isso legitimou o direito de resolução de R. Conhece-se a regra que permite resolver um contrato por incumprimento. Com a notificação enviada a A (Anexo V), nunca contestada perante este Tribunal e, face à falta de cumprimento no novo prazo estabelecido, R resolveu o contrato, respeitando todos os trâmites processuais e substantivos. A mora transformou-se em incumprimento definitivo mediante uma notificação nunca atendível por A.

Mais, nunca se provou em Tribunal o alegado interesse demonstrado por A em cumprir, embora tardiamente.

Tem-se como improcedente toda a linha de argumentação de A. A justificação encontrada para o incumprimento da oitava prestação é a invocação de uma excepção de não cumprimento em face da falta de prestação pecuniária de R aquando da primeira prestação: em primeiro lugar, já demostrou R a sua posição quanto a esta falta – e que tal se deve a uma resposta ao cumprimento defeituoso.
Depois, mesmo que, incredulamente, assim o tribunal não o considere, nunca mas nunca o argumento de A pode proceder. Pedimos a atenção para o art. invocado pelo próprio A para tal: 327.º do CCP, especificamente o n.º 3: “O exercício pelo co-contratante do direito de recusar o cumprimento da prestação depende da prévia notificação ao contraente público da intenção de exercício do direito e dos respectivos fundamentos, com a antecedência mínima de 15 dias”.
Não foi apresentada por A nenhuma prova desta notificação, nem na petição inicial, nem sequer no decorrer do julgamento.

E muito bem entende A a ilicitude da sua actuação e a obrigatoriedade do cumprimento da oitava prestação – senão, por que outra razão pedia ao Tribunal um direito a cumprir a oitava prestação? Não tinha antes alegado uma excepção de não cumprimento?

Como tal, não se tem como justificado o incumprimento da oitava prestação por parte de A.

R resolveu o contrato validamente, facto que nunca foi contestado. Tal baseia-se nos arts. 325.º e 333.º do CCP, apoiados nas regras gerais de incumprimento definitivo do contrato. Subsidiariamente, sempre seria procedente o art. 448.º, conforme art. 60.º da contestação.

E quanto às alegações de A de que a resolução foi abrupta, consideremos o seguinte: R sempre respeitou as regras que regem a resolução do contrato, tendo sido a contraparte notificada por carta efectivamente recebida por um funcionário da empresa. A resolução foi tudo menos inesperada.

Mais, e quanto ao cabimento da resolução, chamamos a atenção do Tribunal para a manifesta falta de boa-fé da contraparte. Acha o Tribunal razoável que A se tenha colocado numa situação financeira tão precária que não consiga cumprir com as suas obrigações contratuais por força do não pagamento – ainda que legítimo – de uma só prestação? Com certeza, os deveres de lealdade e verdade no processo negocial, bem como os deveres de cuidado e boa gestão foram grosseiramente violados por A. E demonstração desta quebra de cuidado exigíveis e, portanto, de confiança, é também a ausência de resposta por parte de A às notificações do Ministério da Defesa.

A não actuou de boa fé.

A primeira prestação de R tem-se como não devida; e o contrato tem-se como bem resolvido.


IV – SOBRE O PEDIDO:

Face a tudo isto, pede-se que o Tribunal considere improcedentes todos os pedidos de A, nomeadamente por se basearem num exercício ilícito da excepção de não cumprimento;

E que condene A ao pagamento de uma indemnização de 1 milhão e 80 mil euros: valor da oitava prestação já paga e da qual nunca houve contra-prestação material, e dos prejuízos causados com tal incumprimento, nomeadamente os do aluguer de viaturas supervenientemente, de acordo com as regras gerais da responsabilidade civil.

Peçamos que se faça a acostumada justiça!







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